Bandas de Pífanos
Por Eduardo Monteiro
Bandas de pífanos, terno de pife, cabaçal e esquenta muié são algumas das denominações atribuídas aos grupos formados por um par de pífanos, uma caixa, e uma zabumba, que em determinadas regiões também por um caixa e pratos; musicam novenas e noitadas Brasil adentro desde que chegaram aqui os primeiros cristãos.
Existem no país de forma regular a partir das missões de catequese aos indígenas, com a interiorização do país e o uso uso da música como instrumento pedagógico e de aproximação entre europeus e nativos – tendo em vista que ambos usavam em sua cultura não só a música como instrumentos de sopro similares aos pífanos modernos. Ao longo do séculos essa miscigenação cultural, ligada sobremaneira a religião e música, foi assimilada e adaptada a cultura dos cativos vindos de países africanos – escravos e libertos – que passaram a habitar o interior do país.
Do litoral ao sertão, a fundação de igrejas em freguesias criava uma demanda por bandas de pífanos, para que completassem as cerimônias religiosas e depois animassem as festas de santos – nesse momento, a depender do povoamento do local, as misturas rítmicas e culturais vem à tona. A depender de quem toca – uma banda de caboclos ou de quilombolas –, as mesmas músicas podem ter sonoridades diferentes, que mostram a pluralidade que compõe a cultura nacional.
Os componentes da banda normalmente são homens do campo, com pouco estudo e muito ouvido – pegam as melodias mimetizando outros tocadores e ouvindo cantos religiosos e elementos do cotidiano (normalmente ligados a lida campesina). Se encontram antes das apresentações para afinar os instrumentos e prepararem o repertório – que invariavelmente parte de músicas religiosas e pode ser incrementado com outros ritmos na hora da festa profana.
Até meados do século 20, o caráter religioso era predominante na maioria das bandas, pois era nas novenas que os músicos tocavam mais vezes e por mais tempo. Nesse contexto, os benditos aos santos, dobrados e valsas de entrada e saída tomavam conta do repertório. Com a apropriação da sonoridade por ícones da música brasileira, como Gilberto Gil, Caetano Veloso, Hermeto Pascoal, Quinteto Armorial, Banda de Pau e Corda e tantos outros e até a confissão de Luiz Gonzaga de que se inspirou diretamente nas bandas de pífanos para destilar seu baião que conquistou o Brasil, provam que elas não ficaram presas ao tempo das caravelas e das novenas rezadas em latim. Reinventaram-se e permearam mansamente a cultura popular ao longo da história.
Hoje em dia há várias formações, motivos e estilos que compõem as bandas de pífano – mesmo sem o par de instrumentos, associando instrumentos de corda ou até eletrônicos; com formações com muito mais que os originais quatro componentes ou corriqueiros seis. No entanto, o que não mudou ao longo dos séculos de existência dessas bandas no Brasil é a capacidade de animar os ouvintes e embalar noites a fio de alegria e devoção.